
Por trás da paisagem, há sempre muito, muito mais
quarta-feira, 24 de novembro de 2010
GREVE - Inconformistas ou conformistas mascarados?
Na greve de hoje pararam as prinicpais empresas públicas, ou seja, pararam as pessoas cuja adesão à greve implica apenas não ganharem o dia de trabalho. O que estas pessoas se esquecem é que aquelas pessoas que lhes pagam os salários - os funcionários das empresas privadas - não têm condições sociais, finaceiras e/ou, inclusivamente, laborais para aderirem à greve.
Foram estas pessoas as principais prejudicadas, foram estas pessoas que chegaram tarde ao local de trabalho - porque tiveram mesmo de chegar! - porque os sindicatos decidiram protestar contra uma decisão que é agora inevitável.
estejamos cientes dos motivos que conduziram a esta greve: a população revolta-se contra os cortes que o governo e a Assembleia da Répública planearam para os subsídios, salários da função pública, a diminuição da comparticipação na medicação - já implementada - a dotação insuficiente de muitos serviços públicos, o congelamento da progressão dos salários... Bem, pelo menos são estes os motivos alegados pelo Sindicato dos Enfermeiros.
Agora vejamos, além de todos nós sabermos de cor o que aqui foi escrito e de, arduamente, digladiarmos os nossos ferozes argumentos nas conversas de café, também sabemos - quem disser o contrário alienou-se da realidade - que as decisões tomadas foram impostas, perdão, propostas, pela UE! Qualquer partido no governo e qualquer pessoa na presidência seria obrigado a proceder de maneira semelhante.
Esquecemo-nos que a nossa situação actual é o resultado de décadas de governação incoerente e "talvez" irresponsável. Mas também, não adianta casar a culpa com a UE, "talvez" a nossa entrada para a então CEE tenha sido apenas um respirar de alívio antes da inevitável catástrofe. Sejamos francos, antes da entrada de Portugal para a CEE, os gestores eram - e são - absolutamente incapazes de gerir de forma sustentável erário público. A situação pouco mudou, as gerações anteriores cometeram erros, foram incipentes e as gerações actuais não tomaram medidas que revertessem o quadro, dormindo à sombra da bananeira - leia-se fundos europeus.
Ora, porque estaremos nós a protestar? Não sei! Realmente não sei. Aliás, não sei se estaremos a protestar ou a encobrir sob a máscara da revolta a nossa vontade de gozarmos um dia de férias, "sendo muito proactivos no interesse da cidadânia", causando prejuízos ao estado (NÓS!!!) no valor de milhões de euros.
Mas sejamos ingénuos, creiamos que temos realmente motivos para protestar. O que fazemos?! Ordeiramente faltamos ao trabalho, em alguns casos, nem asseguramos serviços mínimos, e fazemos pacíficos piquetes de greve. Perdoem-me a linguagem, mas que raio de impacto é que isto tem? Aquilo que eu disse! Atrapalhar a vida do probre coitado que não pode faltar ao trabalho - perdão, fazer greve.
Olhemos para os exemplos da França, Grécia e Irlanda, a população revoltou-se... a sério. Partiu tudo!, Ameaçou a segurança pública. Ainda que de leve, fez o governo penas duas vezes antes de tomar qualquer decisão.
O que conseguimos nós? Perdas de milhões de euros que não me parecem que sejam motivo de insónia para o nossos decisores políticos e financeiros.
Coloquemos as mãos nas nossas consciências, valeu a pena esta greve inútil? Não estaremos a tentar esconder o facto de seros borregos alienados que só se lembram de ser cidadãos no verdadeiro sentido da palavra - aquele que implica direitos e deveres - quando nos pisam os calos? Onde estão os deveres? Terão ficado no sofá ao lado do PC, da Play Station e da TV que nos fazem "tão felizes"?... ACORDEMOS
quinta-feira, 26 de agosto de 2010
A utopia de Thomas More - Uma perspectiva de enfermagem
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
"De quem é a vida afinal?" - Uma perspectiva de enfermagem
"Whose Life is it, anyway?" (De quem é a vida afinal?), de John Badham, 1982
“Ora, uma correcta reflexão sobre esta questão é capaz de relacionar toda a escolha e toda a rejeição com a saúde do corpo e a serenidade da alma, já que é esse o fim da vida bem-aventurada”
Epícuro, excerto da Carta da Felicidade
A análise do filme "De quem é a vida afinal?" trouxe-me sérias inquietações, não necessariamente relacionadas com a eutanásia, mas sim com a condição de tetraplegia da personagem de Richard Dreyfuss. O meu primeiro ensino clínico do Curso de Licenciatura em Enfermagem (CLE) foi numa unidade de neurocirurgia em que muitos dos utentes internados apresentavam tetraplégia causada, principalmente, por acidentes. Foi por isto que este filme me deixou inquieta. No início do curso, a situação de tetraplégia parecia-me o fundo de um abismo, a pior das catástrofes. A pessoa com tetraplégia, manietada pela sua condição física, estaria, para mim, impossibilitada de investir no seu desenvolvimento pessoal, de seguir as suas aspirações. Desde então, não mais me vi confrontada com pessoas nesta situação.
“De quem é a vida afinal” confrontou-me com estes preconceitos adormecidos desde o meu primeiro ano. Embora o personagem manifestasse um desejo de morte e acreditasse no fim da sua vida como única solução possível, os médicos demonstraram uma atitude de obstinação terapêutica. Atitude compreensível, esta a dos médicos, que tendem a ver a morte como o fracasso da medicina – veja-se o aumento considerável da esperança média de vida humana possibilitado por este adiamento constante da morte, através da investigação de novos fármacos, equipamentos, etc. – no entanto, a forma como a justificaram ao seu hipotético doente pareceu- me incipiente e desprovida de fundamentação que tivesse em conta a vontade desta pessoa. Viver por viver não faz sentido, principalmente quando nos referimos a um Ser humano que tende a procurar e construir, ao longo da sua vida, um significado para tudo o que fez, faz e é.
Tem que haver um objectivo. É aqui que devem incidir as intervenções de reabilitação. A própria personagem refere: “Sempre que olho para ti, invejo aquilo que não posso fazer!”. Ora, esta frase revela um intenso sofrimento e a manutenção de objectivos de vida incompatíveis com a sua condição actual. Esta personagem mantém aspirações de vida que devem ser trabalhadas no sentido de construir um projecto de vida viável, realista.
Então, pergunto-me, o que deve fazer o enfermeiro nesta situação? Num dado momento do filme, a personagem refere “já não sou quem era.”. Pois este é um excelente ponto de partida. Claro que já não é a mesma pessoa, já não tem a mesma identidade. Quem somos, ou melhor, aquilo que consideramos que somos é mutável e depende do contexto da nossa vida. Tal como Watson (2002) defende, o Ser Humano é mente, corpo e espírito em interacção e, como os vértices de um triângulo, tende para a harmonia. Quer isto dizer que as alterações das capacidades físicas implicam uma reorganização do auto-conceito da pessoa.
O enfermeiro, baseando-se, por exemplo, nos dez factores do caring (WATSON, 2002), procura construir com a pessoa esta harmonia, esta identidade. É importante que a pessoa compreenda que mantém capacidades, quer estejam adormecidas ou imberbes, e que elas podem potenciar, SE foram trabalhadas, o desenvolvimento da pessoa humana. Que aqui considero como um processo de construção gradual de experiências vividas e analisadas e com significado no continuum da vida (RISPAIL, 2002; JOSSO, s.d.).
Com isto não quero formalizar uma opinião contra a eutanásia - mesmo porque tal não seria verdade – quero apenas que se compreenda que a eutanásia não é a única opção num momento como este. Até porque, infelizmente, o “Homem está condenado a ser livre”, já o disse Sartre[1], e, por isso, o respeito pela autonomia do cliente obriga o enfermeiro a aceitar a decisão da pessoa e a pessoa, a arcar com as consequências das suas decisões.
Regressando ao filme, é então, claro que a alteração do funcionamento desta pessoa não implica a perda da sua identidade, mas sim uma reconstrução. A tertraplégia irá obrigar à construção de um diferente projecto de vida. Afinal, tal como Honoré (2002) defende, o projecto de vida depende do projecto de saúde. Ou seja, a capacidade para o desenvolvimento humano depende do estado de saúde da pessoa, ou melhor, da sua percepção sobre o seu estado de saúde.
Mais uma vez, a construção do auto-conceito é um processo que pode ser desenvolvido pelo enfermeiro. Mobilizando a Teoria do Déficit do Auto-cuidado e a inerente Teoria dos Sistemas de Enfermagem de Orem (1980), encontramos, também, a justificação desta intervenção. Considerando que a autora (1980) postula que um dos requisitos para o auto-cuidado é a manutenção de uma auto-conceito realista, o enfermeiro através de um dos três sistemas de enfermagem – totalmente compensatório; parcialmente compensatório; ou apoio e educação – deve apoiar o cliente no desenvolvimento deste processo.
A estudante de enfermagem, no filme, tem um papel importante nesta intervenção: brinca com o cliente de igual para igual, vê nele uma pessoa tão válida como ela, com tanta dignidade quanto ela e, por isso, procura identificar os seus desejos, as suas aspirações e vontades e actua no sentido de as satisfazer porque também ela, partilha delas, como qualquer Ser Humano.
Em oposição a isto, a relação de paternalismo que os profissionais de saúde tendem a desenvolver em detrimento do livre arbítrio do cliente lesa a Dignidade Humana desta pessoa. Escondendo-se sob a máscara de um maior conhecimento científico, os profissionais tendem a esquecer-se que quem sabe mais sobre esta, ou aquela, doença é o doente porque é ele que a vive e que sofre na pele as suas consequências.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
FERREIRA, Vergílio – O existencialismo e o humanismo de Vergílio Ferreira. Lisboa: Bertrand Editora, 2004. ISBN 9789722513654
HESBEEN, Walter - Trabalho de fim de curso, trabalho de humanidade : emergir como o autor do seu próprio pensamento. Loures: Lusociência, 2006. ISBN 972-8930-31-3.
HONORÉ, Bernard – A saúde em Projecto. Loures : Lusociência, 2002. ISBN 972-8383-31-2.
HONORÉ, B. – Cuidar: Persistir em Conjunto na existência. Loures: Lusociência, 2004. ISBN 972-8383-58-4.
JOSSO, MC. – Procura de formação, projecto de formação, projecto profissional como desafios de uma formação criativa e experiencial a explicitar e a acompanhar. S.d..
RISPAIL, Dominique - Conhecer-se melhor para melhor cuidar : uma abordagem do desenvolvimento pessoal em cuidados de enfermagem. Loures : Lusociência, 2003. ISBN 972-8383-42-8
ROGERS, Carl – Tornar-se pessoa. 2ª edição Lisboa : Moraes Editores, 1973.
WATSON, Jean - Enfermagem : ciência humana e cuidar : uma teoria de enfermagem. Loures: Lusociência, 2002. ISBN 972-8383-33-9.
[1] Da análise de Vergílio Ferreira da obra de Sartre O existencialismo e o humanismo
quarta-feira, 16 de junho de 2010
O APOIO AO PRESTADOR DE CUIDADOS – QUE ESTRATÉGIAS?
“A pouco e pouco, os seus receios foram-se dissipando; a consciência desse contacto íntimo, inesperado (...) mantinha-se no entanto”
Aldous Huxley, excerto de “A Ilha”
Eu e a enfermeira fomos efectuar uma visita domiciliária a um utente do Programa de Cuidados Continuados e à sua esposa, sua principal prestadora de cuidados. O que motivou esta visita foi o tratamento de uma úlcera de pressão no calcanhar do marido mas, mais uma vez, foi um motivo insuficiente para a necessidade de cuidados de enfermagem de que ambos os cônjuges necessitavam.
Assim que nós entrámos na casa do casal, dirigimo-nos directamente ao quarto do esposo. Este estava no leito e, durante todo o tratamento, foram raras quaisquer verbalizações da sua parte. A esposa, no entanto, manteve um discurso fluído, falando do pouco tempo que tinha para “tratar de outros assuntos” (sic) – como o pagamento de contas, compras, etc. - e que só podia fazê-lo num breve período do início da manhã.
Terminámos o tratamento da ferida e fomos lavar as mãos, a esposa seguiu-nos até à casa-de-banho com uma toalha. Aproveitando o momento, perguntei o que o esposo iria comer e que precauções costumava ter com a sua alimentação, já que o seu marido tem diabetes e faz diálise três vezes por semana. Mostrou-me o peixe que ainda iria cozinhar, falou-me dos truques que utilizava para o fazer comer carne com a sopa, “é que, sabe, eu tenho que ter muitos cuidados com a comida dele” (sic). Daqui, voltou a referir o pouco tempo que tinha para si própria e o facto de também não se sentir bem “a minha tensão está muito alta e isto está a piorar” (sic), “eu ando muito cansada” (sic). Perguntei porquê, o que se passava, quais as razões para o seu mal-estar e há quanto tempo já durava. Respondeu-me que já se tinha reformado há dois anos e que há um ano que andava “nisto” (sic). “Nisto o quê?”, perguntei. Respondeu-me, então, que estava cansada de andar com o marido de um lado para o outro, de estar sempre a ser solicitada por ele, de não conseguir dormir, de ter que estar preocupada todo o tempo que passava fora de casa com o que estava a acontecer com ele em casa, “estou esgotada” (sic) concluiu e, algures no arrebatamento do seu discurso, começou a chorar. “Eu não sei se aguento muito mais” (sic) disse num tom de desânimo.
Deixei que a torrente de palavras terminasse e toquei-lhe. Perguntei-lhe se tinha outra ajuda para cuidar do marido, tendo respondido que que não; o filho estava longe e só vinha a casa de vez em quando e que já não havia vagas para o apoio domiciliário do centro paroquial. Perguntei-lhe como era organizado o seu dia e disse-me que acordava de manhã, que lhe dava o pequeno-almoço, depois que o ajudava a tomar banho e, só então, saía de casa se fosse necessário. Voltava a casa, preparava o almoço, dava o almoço ao marido, este fazia a sesta e a esposa aproveitava para descansar. Assim que acordavam, repetiam-se as tarefas para o jantar e voltavam a dormir.
Nestas situações, a minha principal preocupação é arranjar uma solução milagrosa que resolva rapidamente o problema, mas as mais estranhas experiências provaram que eu não tenho solução para tudo e que a cada pessoa corresponde um tempo e uma maneira de agir que devem ser sempre tidas
Mas, também é verdade que a prestação de cuidados só tem sentido se o prestador cuidar não só da pessoa cuidada mas também, e talvez principalmente, de si próprio. Um prestador de cuidados que relega a sua identidade e o seu prazer para segundo plano, parece-me, estará mais próximo da frustração e da sobrecarga, pois terá como única fonte de retorno os progressos da pessoa de quem cuida. Esta atitude poderá fazer o prestador de cuidados esquecer-se do que é ser feliz e, pior, esquecer-se do que o faz ser feliz. Dependendo apenas do bem-estar do outro como fonte de prazer, quaisquer alterações negativas no seu estado geral serão vividas por ambos com intensidades semelhantes, o problema de um passará a ser dos dois, tal como as suas consequências.
Por tudo isto, foquei ainda a minha intervenção na atenuação de pelo menos uma das manifestações: a falta de sono e de descanso, que poderá ser uma das causas da hipertensão. Identificando o período da sesta como o menos ocupado pelas exigências do cuidado, incentivei-a a utilizá-lo como um período para si própria, quer pela sesta, quer pela procura de actividades que lhe dessem prazer, tendo a esposa nomeado actividades manuais como crochêt e tricôt.
Concluído isto, incentivei-a a procurar novamente ajuda formal para a prestação de cuidados de higiene e talvez alimentação, tal como a sentir-se à vontade para expressar estes sentimentos às enfermeiras que efectuassem a visita domiciliária. Expliquei-lhe que estávamos ali também para a ajudar a adaptar-se à situação do seu marido e ao seu papel de prestadora de cuidados. A esposa assentiu, mas insistiu em pedir desculpa por ter chorado e agradeceu o tempo da entrevista, referindo que “por vezes preciso de falar” (sic), disse. Reiterei que não deveria pedir desculpa por chorar, já que a sua situação é complicada e nem sempre podemos mostrar que estamos bem, quando, na verdade, não estamos.
A entrevista terminou aqui e, pouco depois, saímos da casa.
O problema de enfermagem que aqui quis descrever é a sobrecarga do familiar prestador de cuidados que, para Sousa, Figueiredo e Cerqueira (2006) é o conjunto de problemas físicos, económicos e psicológicos causados pela situação de cuidados. A prestadora de cuidados aqui referida já manifesta o esforço psicológico e físico acrescido na prestação de cuidados.
Nesta situação, a esposa já está a ultrapassar os seus limites da resistência emocional na prestação de cuidados ao marido. Apresenta perturbações do sono, ingerência nas actividades de lazer e verbalizou que já está esgotada, cansada. Além disso, não tem uma rede social grande nem eficaz, dependendo dela própria a satisfação da maior parte das exigências do cuidado ao marido.
São várias as intervenções que poderiam ser desenvolvidas perante este problema. Se pensarmos na dimensão funcional da prestação de cuidados e nas inerentes actividades para a satisfação de exigências de higiene, alimentação e eliminação, estamos a falar de uma necessidade de apoio formal no desenvolvimento das actividades. Este pode ser desenvolvido por instituições privadas de solidariedade social ou, talvez, pelos próprios enfermeiros de cuidados continuados, se a sua dotação fosse suficiente. Além disso, da equipa do Programa de Cuidados Continuados faz parte uma assistente social que é o profissional mais habilitado para o estabelecimento de pontes com os serviços sociais de apoio ao domicílio. Mais se acrescenta que a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados também prevê, nos seus internamentos de longa duração, situações de sobrecarga do prestador de cuidados, onde o internamento da pessoa cuidada terá como principal objectivo o alívio do prestador de cuidados.
Quanto ao apoio na vivência do papel de prestador de cuidados, outras intervenções poderiam ser desenvolvidas. Uma delas é a manutenção de entrevistas de apoio e suporte psicológico realizadas pelo enfermeiro do Programa de Cuidados Continuados com frequência, intervenção esta já desenvolvida pelas enfermeiras. Nestas entrevistas, o enfermeiro pode compreender a forma como o prestador de cuidados se está a adaptar à situação, identificar com ele os seus principais problemas e, também com ele, desenvolver um plano de cuidados que não integre apenas a parceria nos cuidados à pessoa que está acamada ou mais dependente, mas também os objectivos e as intervenções que fazem do prestador de cuidados um cliente igualmente importante dos cuidados de enfermagem. Afinal, o enfermeiro de cuidados domiciliários não tem apenas como clientes os utentes inscritos para o tratamento de feridas, administração de terapêutica ou outros procedimentos técnicos, são seus clientes todos os membros do agregado familiar e, no caso de prestadores de cuidados não familiares, os amigos e vizinhos que assumam esse papel.
Eu reitero que nunca nos podemos esquecer de que a prestação de cuidados é uma pareceria entre o próprio prestador e a pessoa cuidada: o prestador cuida COM a pessoa cuidada porque esta última também desempenha um papel – menor ou menor – no seu auto-cuidado e, da mesma forma, o prestador de cuidados tem que se ter na conta de um Ser Humano ao qual também correspondem necessidades que, se ignoradas, implicam uma degradação progressiva do seu bem-estar bio-psico-social.
Esta intervenção descrita é individual porque se desenvolve com apenas um prestador de cuidados de cada vez e também personalizada porque é única e os seus moldes são irrepetíveis. Mas questiono-me: não será possível desenvolver uma intervenção de acompanhamento de prestadores de cuidados em grupo?
Pensando nos benefícios de um grupo de apoio, com ele estaremos perante um momento partilha de experiências, identificação com o outro e comprensão de si próprio. Couceiro (1998) defende que a transmissão da vivência é essencial para a construção de uma experiência com significado. Ora, podendo partilhar as suas vivências – os melhores e piores momentos e até mesmo os pormenores do dia-a-dia – poderia ajudar os prestadores de cuidados a encontrarem um significado e, até mesmo, uma finalidade para o esforço que desenvolvem. Desenvolvida esta finalidade, seria mais fácil o empenho e a integração das actividades desenvolvidas num projecto de vida próprio.
A intervenção num grupo de apoio permite, ainda, a identificação com as experiências dos outros. Sentimentos negativos, geradores de culpa e pesar poderiam encontrar eco nas experiências de outros cuidadores. Sabendo que o outro, igual e mim em circunstância, vive da mesma forma esta situação, que o outro se sente tão incomodado como eu, o meu sentimento de culpa será atenuado, pois compreenderei que o meu ressentimento é o mesmo de outro. Então, porque é que ambos nos ressentimos? O que há de comum nas nossas histórias para suscitarem sentimentos semelhantes? Através de raciocínios como este, os prestadores de cuidados num grupo de apoio, poderiam analisar as suas experiências até ao cerne do seu significado e, assim, desconstruir mitos e sentimentos nocivos, tanto para o prestador de cuidados, como para a pessoa cuidada.
Outra das vantagens deste tipo de intervenção é trazida pela frequência das reuniões e por uma certa obrigatoriedade – claro que trabalhada e não exigida. Se os prestadores de cuidados se encontrarem em grupo, semanalmente, na presença do enfermeiro, este terá a oportunidade de avaliar situações de cuidados, mesmo quando o utente dependente já teve alta. Além disso, o enfermeiro pode desenvolver intervenções educativas no sentido de capacitar o prestador de cuidados para exercer ainda melhor o seu papel.
Esta intervenção exige um esforço acrescido dos enfermeiros; no entanto, os seus benefícios a longo prazo trazidos pela capacitação adequada dos prestadores de cuidados para exercerem o seu duplo papel de auto-cuidador e cuidador de outrém, poderiam torná-la uma intervenção vantajosa. Haverá uma incidência menor da sobrecarga do cuidador e de depressão, condições que impossibilitam o prestador de cuidados de desenvolver a sua actividade e, por isso, sobrecarregando as redes de apoio formal; e, inclusivamente, diminuir a incidência de problemas decorrentes da imobilidade, como úlceras de pressão, degenerações osteo-articulares, desnutrição, etc.
Voltando a pegar na situação acima descrita, a intervenção que desenvolvi está integrada no plano de cuidados do enfermeito responsável pela visita domiciliária desta família, limitei-me apenas a dar continuidade ao trabalho desenvolvido. No entanto, é de planear um contacto brevemente com o centro paroquial que a esposa referiu ou outra instituição privada de solidariedade social que venha diminuir a sobrecaraga física da cuidadora.
BILBIOGRAFIA
COUCEIRO, M. – Autoformação e transformação das práticas profissionais dos professores. In Revista de educação. Vol VII. Nº 2 1998
SOUSA, Liliana; FIGUEIREDO, Daniela; CERQUEIRA, Margarida – Envelhecer em Família: Os cuidados familiares na velhice. 2ªedição. Porto: ÂMBAR – Ideias no Papel, 2006. ISBN: 972-43-1152-X.
terça-feira, 8 de junho de 2010
O ACOMPANHAMENTO DOMICILIÁRIO – QUEM DEFINE A SUA PERTINÊNCIA?

Antoine de Saint-Exupèry, excerto de “O principezinho”
Até agora, as minhas experiências enquanto estudante de enfermagem estão demasiado interligadas com o hospital. Lá, comecei a aprender o que é assistir o Ser Humano em situações de extrema vulnerabilidade súbitas. Foi no hospital que me deparei com os efeitos do acaso, do imprevisto e que tive de aprender a lidar com a família e o cliente que sofrem um processo de luto pela perda da vida vivida até então. Foi no hospital que dei, com a família, os primeiros passos na preparação para a transição do hospital para o domicílio, que tive que, também com a família e o seu elemento internado, antever as dificuldades que iriam experimentar para se adaptarem à nova situação de doença.
Foi nesta preparação que compreendi o quão inexperiente era para ajudar a família a regressar a casa. Eu podia conhecer as complicações que determinada doença crónica acarretava, sabia as dificuldades que determinado episódio agudo implicava, mas não conhecia o verdadeiro contexto da pessoa que vive em casa com uma doença que implica alteração do seu nível de dependência. Desconhecia o que significa realmente “cuidar em casa” – Que preocupações? Que necessidades? Que motivações? Que alterações na vida de toda a família?
Foi neste contexto e com estas peocupações em mente, que surgiu a minha necessidade de desenvolver um ensino clínico na comunidade e no verdadeiro contexto de vida das pessoas de quem cuido e cuidarei ao longo da minha vida. Só assim, acredito, poderei prestar cuidados de enfermagem realmente completos e abrangentes da vida singular de cada indivíduo e da dinâmica familiar a que pertence.
Um dos primeiros momentos de inquietante aprendizagem foi uma visita pré-alta dos Cuidados Continuados de Enfermagem, a uma cliente com cirurgia recente do hallux. Eu e a enfermeira entrámos na casa. Papel de parede antigo revestia as paredes numa viagem à primeira metade do século XX, complementada por móveis com aplicações e pinturas douradas. À porta, estava uma mulher septuagenária, com cabelo pintado de loiro e penteado armado. Estava sozinha e guiou-nos, claudicante, até ao seu quarto – uma divisão pequena, dominada pela cama de casal e iluminada por luz natural. Sentou-se na beira da cama e indicou-nos a cama e a cadeira à sua frente para nos sentarmos.
Realizei o tratamento da sutura operatória, já totalmente cicatrizada e coloquei o penso protector, seguindo as instruções da dona do pé que esteve sempre atenta aos movimentos. Durante todo este tempo, a senhora falou-nos do seu problema de osteoartrose, das varizes que há anos operou e que agora “voltaram a incomodar”(sic), fez-nos uma súmula da sua história de doenças. O seu discurso era pontuado por breves interrogações nossas e exclamações de dor quando o toque das minhas mãos atingia zonas sensíveis do seu pé.
Depois de lavarmos as mãos perguntei, fora tudo aquilo que nos tinha relatado, como se tinha sentido globalmente nos últimos dias. Uma simples pergunta – “Como tem passado?” repercutiu estrondosamente no comportamento da senhora. De uma atitude de serena conformação, passou para o choro e tristeza pungentes. Entre lágrimas disse que estes dias não tinham sido fáceis, não por causa do pé, não por causa do forçado repouso, nem por causa da dor. Por nenhuma das razões que à partida nos tinham levado à sua casa; mas porque a visita do Papa tinha tornado mais fortes as lembranças da irmã falecida há três anos.
Falou-nos da sua relação com a irmã, do apoio que tinham sido uma para a outra, das histórias em conjunto. Sentia muito a sua falta. A partir daí, falou-nos da sua filha que faleceu aos 3 anos de idade, dos seus 40 anos de viuvez e de como nunca se tinha sentido tão sozinha como a partir da morte da sua irmã.
Durante o relato pouco interviemos, só quando a intensidade do discurso amainou é que dirigimos a entrevista até ao momento presente. Como era a sua vida agora? Quem a apoiava? Quem a visitava? O que gostava de fazer? Com estas perguntas tentámos procurar no “agora” o que de bom existia na sua vida. Então, falou-nos da vizinha que muito a apoiava – “Todos os dias vem cá”(sic) – falou-nos de outras vizinhas com quem também podia contar e, a pouco e pouco, os seus olhos secaram. O seu discurso tornou-se pragmático e explicou-nos em que consistiam os apoios que recebia, o que ainda fazia por si própria e o que esperva voltar a fazer assim que o pé melhorasse.
Terminámos a entrevista pouco depois mas, ainda antes de nos despedirmos, pediu desculpa por ter chorado, não o queria ter feito, mas as lembranças eram demasiado fortes. Dissemos que não eram necessárias quaisquer desculpas pois ninguém deve pedir perdão por algo que lhe é tão natural e necessário. Pediu-nos que regressássemos mais tarde, disse-nos que seríamos sempre benvindas, embora a data de regresso permanecesse indefenida.
Esta situação trouxe-me algumas inquietações. Uma delas tem que ver com o motivo da visita domiciliária (VD) e as reais intervenções de enfermagem. No Programa de Cuidados Continuados do Centro de Saúde da Alameda, a primeira VD implica, na maioria das vezes, uma prescrição médica inicial quer seja para tratamento de feridas ou administração de injectáveis. Já as visitas de vigilância e acompanhamento, não, são planeadas pelo enfermeiro.
Ora, na primeira visita, o enfermeiro nunca se limitará a desenvolver as intervenções prescitas pelo médico – ou interdependentes. Levará a cabo, também, intervenções autónomas como a avaliação da situação de saúde do cliente, do seu contexto social, do impacto da situação na família e do impacto da situação no próprio cliente (RICE, 2004). Aliás, o próprio tratamento duma ferida implica muito mais do que a escolha de alguns apósitos, implica uma definição de objectivos com o cliente e implica um trabalho de parceria baseado no compromisso mútuo. Então, pergunto-me: Será sempre necessária a prescrição médica? O enfermeiro não poderá decidir se inicia, ou não, o acompanhamento domiciliário?
Por tudo o que aqui se decreve, a resposta óbvia é sim, o enfermeiro pode e deve tomar essa decisão, mas não é tão linear como parece. Por um lado, sendo o enfermeiro um profissional autónomo, com quadro referencial próprio e preparado para o processo de tomada de decisão, tem toda a competência para decidir o desenvolvimento, ou não, de acompanhamento domiciliário, baseado nas necessidades de enfermagem. Afinal, as intervenções de enfermagem no domicílio do cliente excedem, em muito, as prescrições do médico. Isto significa que os motivos da VD devem englobar todas as necessidades humanas, tal como as vê a diciplina de Enfermagem. Relegar a decisão sobre o início do acompanhamento, ou não, por enfermeiros, ao médico, é segmentar a pessoa e reduzi-la à sua existência biológica.
Já no que diz respeito ao término do acompanhamento domiciliário, a situação inverte-se. O enfermeiro decide até onde se devem efectuar VD’s; e esta é uma das grandes diferenças entre os cuidados continuados e o hospital. No hospital, o fim do internamento tende a depender da alta clínica e, em alguns casos, da alta social. Raramente o enfermeiro tem a última palavra, principalmente se os profissionais de saúde só funcionarem em equipa pelo nome. No entanto, nos cuidados continuados, é o enfermeiro que decide até onde deve ir o tratamento. É o enfermeiro quem conhece melhor a situação do cliente e as suas respostas, estando mais habilitado para decidir quando deve cessar o acompanhamento.
Voltando à pergunta - Será sempre necessária a prescrição médica? – e à situação descrita, existe ainda uma necessidade de cuidados de enfermagem, apesar da alta. Pela NANDA, o diagnóstico de enfermagem “Risco de Solidão” implica algumas das características aqui relatadas: diminuição da rede social informal e aumento do nível de dependência (CARPENITO-MOYET, 2005). Remetendo-nos este diagnóstico para o necessário desenvolvimento da relação enfermeiro-cliente, podemos reportar-nos a Hildegard Peplau e às 4 fases que a teórica descreveu para esta relação: orientação, identificação, exploração e resolução (MARRINER-TOMEY e ALLIGOOD, 2004). Estas fases, idependentemente da duração da relação devem existir de forma mais, ou menos, pronunciada. A fase correspondente à situação descrita é a de resolução que, para Marriner-Tomey e Alligood (2004), implica a construção de objcetivos novos, diferentes daqueles definidos perante a situação de doença, e a separação do enfermeiro e do cliente. Por isso, é importante que, quando o acompanhamento domiciliário começa a chegar ao fim, se comecem a estabelecer metas além da situação de doença e que se integrem num projecto de vida em desenvolvimento, que deve ultrapassar o momento actual de necessidades.
No exemplo descrito foi importante trabalhar com a cliente os factores que promovem o seu bem-estar e que existem “agora”.
Para Marriner-Tomey e Aligood (2004), Peplau também defende que o enfermeiro tem, entre outros papéis, o de conselheiro que ajuda o cliente a compreender a sua situação actual de doença, ajudando-o a integrá-la na sua história de vida, tal como a percebe. Este papel, num tempo de interacção tão curto como o aqui descrito (para este problema actual, nós – enfermeira e eu – só visitámos a senhora uma vez. Nos dias anteriores, a VD foi realizada por outras enfermeiras), não está necessariamente comprometido. Dele irradiam intervenções como as realizadas: preparação para o regresso à vida quotidiana, anterior à cirurgia; reforço dos recursos (as vizinhas); e planeamento de formas de satisfação das necessidades humanas fundamentais.
Justificada a pertinência da decisão autónoma do enfermeiro sobre a realização, ou não, de acompanhamento domiciliário, é importante compreender que esta decisão nem sempre depende da existência de necessidades humanas básicas por satisfazer. Afinal, a teoria será cega se não adaptada à prática e o Programa de Cuidados Continuados deste Centro de Saúde tem uma dotação de enfermeiros muito inferior à ideal. Querendo isto dizer que, intervenções como as aqui descritas podem, sim, ser realizadas, mas em tempo útil da VD para tratamento, vigilância ou administração de terapêutica, tornando-se supérfluas quando entram em competição com necessidades ainda mais fundamentais de outros clientes do Programa. No entanto, no quadro de valores e documentos orientadores da prática de enfermagem – como o é o Guia das Competências do Enfermeiro de Cuidados Gerais – estas necessidades e intervenções não são supérfluas, tornando-se necessária a re-avaliação dos actuais recursos do Programa de Cuidados Continuados. Só assim se poderão prestar cuidados de enfermagem de qualidade – como já o são – mas completos – como só o aumento do tempo de VD pode permitir.
Eu sei que do Programa de Cuidados Continuados deste Centro de Saúde faz parte uma equipa de profissionais de saúde – médicos, enfermeiros, assistente social e psicóloga. No entanto, a conclusão a que quero chegar é que o acompanhamento domiciliário implica um conjunto de competências que o enfermeiro domina e que excedem em muito as prescrições médicas, logo, a determinação da necessidade de acompanhamento, quer seja o seu início ou o seu prolongamento, também deverá ser dependente do parecer do enfermeiro. Sendo que, necessidades que não implicam inervenções instrumentais, mas que fazem parte dos focos de atenção do Enfermeiro devem, também elas constituir motivos para o início da visita domiciliária. Um exemplo prático seria o acompanhamento desta senhora, mesmo após a cicatrização da sutura, tendo em vista a realização de entrevistas de apoio e suporte psicológico não só para aumentar o nível de independência da cliente, mas também para desenvolver estratégias de coping face à situação de luto que a cliente ainda vive.
BILBIOGRAFIA
CARPENITO-MOYET, Lynda H. - Diagnósticos de enfermagem : aplicação à prática clínica. 10ª ed. Porto Alegre: Artmed Editora. 2005. ISBN: 85-363-0187-2.
MARRINER-TOMEY, Ann; ALLIGGOD, Martha R. - Teóricas de enfermagem e a sua obra : modelos e teorias de enfermagem. 5ª ed. Loures: Lusociência. 2004. ISBN: 972-8383-74-6.
RICE, Robyn - Prática de enfermagem nos cuidados domiciliários : conceitos e aplicação. 3ª ed. Loures: Lusociência. 2004. ISBN: 972-8383-46-0.
terça-feira, 25 de maio de 2010
Vamos re-pensar os valores da nossa luta?
«A lata dos enfermeiros, segunda parte
Os enfermeiros marcaram umas férias, perdão, uma greve de quatro dias. Porquê? Não se percebe. Mas fica a ideia de que querem ganhar mais do que os médicos.
Henrique Raposo (www.expresso.pt) 9:00 | Terça-feira, 30 de Março de 2010 |
I. A lata dos enfermeiros continua . Para começar, uma greve séria não tem quatro dias. Uma greve séria não é marcada para os quatro dias imediatamente anteriores ao feriado da Páscoa. Assim, até parece que os senhores enfermeiros marcaram umas férias antecipadas. Caro enfermeiro, se não quer ser confundido com o lobo, não lhe vista a pele.
II. Fazer reivindicações sem sentido é o desporto do nosso sindicalismo. Os enfermeiros não são excepção. Agora, Suas Excelências querem ganhar 1200 euros logo no início de carreira. Não se percebe porquê. Em primeiro lugar, um licenciado na função pública não pode ganhar 1200 logo à partida (se ganhar, o país enlouqueceu mesmo). Em segundo lugar, se ganhar 1200 euros, um enfermeiro fica a ganhar quase tanto como um médico em início de carreira. E, lamento, isso não faz sentido.
III. A diferença entre os 1500 euros do jovem médico e os 1000 euros do jovem enfermeiro é a diferença justa. Aliás, parece-me que já beneficia, e muito, o enfermeiro. Porque a responsabilidade do médico é, obviamente, superior à do enfermeiro. Dentro do hospital, o médico é superior ao enfermeiro.Lamento, mas as coisas são assim, por mais lógicas corporativas que os enfermeiros invoquem. O corporativismo sindical não pode abolir as óbvias diferenças técnicas e de responsabilidade que existem dentro de um hospital.
IV. Quando se fala com os enfermeiros, parece existir sempre uma espécie de ressentimento "classista" contra os médicos. É como se os enfermeiros estivessem a gritar contra os médicos: "olhem, olhem, nós agora também somos licenciados, e sabemos tanto como vocês". Será por isso que os enfermeiros não fazem o trabalho "sujo" nos hospitais? Será por isso que tem de haver aquele batalhão de auxiliares para as tarefas sujas e simples? O dr. enfermeiro já é demasiado fino para limpar o rabo aos velhinhos? É isso?"»
Não sei se fico mais ofendida com o jornalista e com o expresso por terem publicado esta ofensa pública e em massa, ou se fico triste com o trabalho que temos desenvolvido - enquanto classe de profissionais de saúde - até agora na construção de uma opinião pública consistente e de acordo com a verdadeira intervenção dos profissionais de enfermagem.
Senti que esta declaração não poderia ter ficado sem resposta, por isso, enviei a seguinte resposta para o correio do expresso, não tendo obtido qualquer contra-resposta, pelo menos até ao momento:
É importante que nos preocupemos mais em desconstruir esta imagem da "enfermeira ajudante do médico", do que em subir de estatuto. Se pensarmos bem, uma casa não se constrói pelo telhado e se o enfermeiro não conseguir provar a todos os portugueses - que tenham experimentado ou não os cuidados de saúde - a sua importância, não conseguirá nenhum aliado na conquista de outros direitos.